MINHA DECISÃO - Terceira Carta


TERCEIRA CARTA

Saint Martin's Porch


Blackheath, janeiro de 1875

Meu amado irmão,

Ao retornar para a Inglaterra, mais uma vez teve início o meu ministério. Por eu ainda estar fraco, minha amada congregação gentilmente permitiu que eu pregasse apenas uma vez, no dia do Senhor, e através das misericórdias de nosso Deus e Pai eu era capaz de fazer isso com relativa facilidade e muita alegria. Acredito que nunca antes havia sentido tanto a presença de Deus e o poder do Espírito Santo na pregação da Palavra. A razão, sem dúvida, foi que nunca antes havia tantas orações elevadas a Deus para que a força do Senhor pudesse ser aperfeiçoada em minha fraqueza.


Independe de todas essas experiências felizes, o Senhor estava prestes a fazer com que eu deixasse aquela posição. Você está ciente do rumo peculiar em que fui guiado, portanto sabe que não dei o passo de minha própria vontade, mas fui forçado a agir pelas influências que vinham de fora. Convoquei uma reunião de crentes e li para eles um texto que continha as principais verdades que eu professava naquele momento. Transcrevo abaixo uma parte dele que ajudará a explicar as mudanças que fui levado a fazer. Depois de citar algumas referências pessoais, continuei o texto assim:

“Dizem que ensinei doutrinas dos chamados ‘irmãos de Plymouth’ no último dia do Senhor. Acontece que em duas ocasiões anteriores expressei exatamente os mesmos pontos de vista e, ao que me consta, não houve uma única reclamação. Porém, a pergunta mais importante é: ‘Será que preguei verdade ou erro? Pelo fato de os católicos confessarem a divindade do Senhor Jesus, deveria eu rejeitar esta doutrina tão verdadeira e abençoada? Todavia, confesso que não concordo em grande parte com as doutrinas geralmente associadas aos chamados ‘irmãos’. Há treze anos, quando comecei meu ministério aqui, eu era um ótimo estudante e lia muitos livros. Mas o Senhor gradualmente me mostrou que, com o Espírito Santo como Guia e Mestre, a Bíblia é autossuficiente para a instrução do homem de Deus (João 14:16-17). Assim, o número de livros que eu lia tornou-se cada vez menor. Agora as Escrituras são a minha principal companheira e meu único livro-texto para o púlpito”.

“O resultado disso foi que precisei rejeitar a maior parte dos pontos de vista que eu tinha aprendido, e tive de confessar que muitas das doutrinas dos chamados ‘irmãos’ estavam de acordo com o pensamento de Deus. Por exemplo, vi que é correto congregar no dia do Senhor simplesmente como cristãos para partir o pão. Também, no que diz respeito à verdade dispensacional, embora eu discordasse dela em alguns pontos importantes, concordava com eles em suas linhas gerais, como, por exemplo, no retorno pré milenar de Cristo, na primeira ressurreição dos crentes, no arrebatamento dos santos e em sua associação com Cristo na glória de Seu reino milenar. Também concordava com uma restauração e conversão dos judeus e uma conversão do mundo, não pela pregação do Evangelho, antes da segunda vinda de Cristo, mas depois da volta do Senhor, quando Deus dará ‘uma linguagem pura aos povos, para que todos invoquem o nome do Senhor, para que O sirvam com um mesmo consenso’ (Sofonias 3:9). Também concordo com eles, de um modo geral, no seu ensino relativo à posição e ao andar dos crentes, sua separação do mundo, e a habitação do Espírito Santo. Tenho discordado deles em outros pontos. Não fosse este o caso, creio que teria tido a graça de estar unido a eles. Se eu tivesse sido plenamente convencido do terreno que adotam para a adoração e o ministério, teria sido meu o prazer de buscar glorificar a Deus em obediência à Sua vontade”.

“E vou mais longe. Muitas vezes eu já disse em conversa com amigos que, em algumas circunstâncias, eu preferiria estar com os chamados ‘irmãos’ do que com outros cristãos. Mesmo agora, se eu estivesse em um lugar onde nenhuma verdade definitiva fosse ensinada, eu iria procurar o privilégio de ter comunhão com eles no partir do pão”.

“Sempre expressei meu arrependimento por ter escrito o livro contra os ‘irmãos’, pois logo descobri que os unitarianos, clérigos e outros ministros pelos quais eu não nutria a menor simpatia estavam usando meu livro para promover sua causa. Senti, portanto, que estava no campo errado e envolvido com o erro. O livro foi também citado em jornais e artigos para apoiar opiniões que eu rejeitava por completo. Daí eu expressar minha profunda tristeza de ter um dia publicado tal obra, apesar de naquele momento ela conter minhas mais sinceras convicções. Nestes dias de mundanismo e erro eu preferiria muito mais ver cristãos com os chamados ‘irmãos’ do que na Igreja da Inglaterra ou com muitos independentes e batistas. Aproveito esta oportunidade para dizer que agora não concordo com afirmações e opiniões que meu livro contém”.

Portanto, querido irmão, este era o teor do texto que li na ocasião. Depois de lê-lo anunciei que, uma vez que meu ensino havia sido colocado em dúvida, eu renunciaria a meu pastorado. Voltei para casa com um gozo no coração como há muito eu não experimentava, pois senti que o Senhor havia aberto uma porta para eu poder apresentar claramente toda a verdade que confessava. Eu tinha certeza de que, quaisquer que fossem as provações que minha fé viesse a sofrer relacionadas à separação de minha congregação, Aquele que havia me falado tão claramente me daria a graça de ser fiel e a força para o testemunho para o qual eu pudesse vir a ser chamado, além da capacidade de seguir adiante, embora o caráter do caminho no qual eu estava entrando estivesse totalmente escondido.

Afetuosamente seu, no Senhor,

Edward Dennett

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Breve Biografia de Edward Dennett

Edward Dennett nasceu em Bembridge, Isle of Wight, em 1841 e partiu para estar com o Senhor em Croydon em Outubro de 1914. Ele se converteu ainda jovem por intermédio de um clérigo piedoso e sua família pertencia à Igreja Anglicana, a qual ele abandonou por convicções pessoais.

Graduou-se pela London University e assumiu o posto de ministro de uma congregação Batista em Greenwich. Após adoecer gravemente foi enviado à Suíça em Março de 1873 para tratamento e, enquanto estava em Veytaux, reconheceu que sua posição contra os "Plymouth Brethren" e o livro que escreveu criticando o movimento não tinham fundamento bíblico.

De volta à Inglaterra apresentou suas convicções à congregação que dirigia e deixou-a. Depois de estudar os ensinos dos "irmãos" e compará-los com as Escrituras, entrou em contato com William Kelly e acabou tomando seu lugar em comunhão. Dennett trabalhou na obra do Senhor na Inglaterra, Escócia, Irlanda e também visitou a Noruega, Suécia e América do Norte.

Um acervo das obras de Edward Dennett em inglês pode ser encontrado na Bible Truth Publishers (em formato impresso ou digital) e em Stempublishing (digital).