O Corpo de Cristo
Existe outra questão, que agora exige sua atenção,
relacionada ao corpo de Cristo. No dia de Pentecostes ocorreu algo
completamente novo no desenrolar dos desígnios de Deus - a vinda do Espírito
Santo. Até aquele período o Espírito Santo agia neste mundo, pois em todas as
dispensações passadas houve almas vivificadas e "homens santos de Deus
falaram inspirados pelo Espírito Santo" (2 Pedro 1.21). Mas até o Senhor
Jesus ter sido glorificado à direita de Deus, o Espírito Santo, como uma Pessoa
divina, não estava neste mundo. Isto não se trata de uma nova teoria, mas é um
assunto claramente estabelecido nas Escrituras. Assim, quando no grande dia da
Festa dos Tabernáculos, "Jesus pôs-se em pé, e clamou, dizendo: Se alguém
tem sede, venha a Mim, e beba. Quem crê em Mim, como diz a Escritura, rios
d'água viva correrão do seu ventre", é explicado que falava "do
Espírito que haviam de receber os que nEle cressem; porque o Espírito Santo
ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado" (João
7.37-39). O próprio Senhor acrescentou no mesmo sentido: "Todavia digo-vos
a verdade, que vos convém que Eu vá; porque, se Eu não for, o Consolador não
virá a vós" (João 16.7; compare com João 14.16,17, 26 e 15.26).
Passando mais adiante, em Atos 2, encontramos o registro
histórico da descida do Espírito de Deus: "E, cumprindo-se o dia de
Pentecostes, estavam todos reunidos no mesmo lugar; e de repente veio do céu um
som, como de um vento veemente e impetuoso, e encheu toda a casa em que estavam
assentados. E foram vistas por eles línguas repartidas, como que de fogo, as
quais pousaram sobre cada um deles. E todos foram cheios do Espírito Santo, e
começaram a falar noutras línguas, conforme o Espírito Santo lhes concedia que
falassem" (Atos 2.1-4). Assim se cumpriram as palavras que o Senhor falou
aos Seus discípulos após a Sua ressurreição: "vós sereis batizados com o
Espírito Santo; não muito depois destes dias... Mas recebereis a virtude [ou
poder] do Espírito Santo, que há de vir sobre vós" (Atos 1.5,8).
Foi pela descida do Espírito Santo que a Igreja foi formada
- a Igreja de Deus conforme é encontrada no Novo Testamento - e desde então ela
existe em dois aspectos: como a casa de Deus (1 Timóteo 3.15) e como o corpo de
Cristo (Efésios 1.22,23). É o segundo aspecto da Igreja que desejo trazer
diante de você nesta carta, e há dois versículos que nos capacitarão a
compreender isto. Em Colossenses 1.18 lemos que "Ele é a cabeça do corpo
da Igreja"; e em 1 Coríntios 12.13, "Pois todos nós fomos batizados
em um Espírito formando um corpo, quer judeus, quer gregos, quer servos, quer
livres". Isto parece indicar que no dia de Pentecostes, pela vinda do
Espírito Santo, os crentes foram batizados em um corpo, e que assim foi formado
o corpo de Cristo.
Mas, permita-me perguntar, de que, ou de quem, é composto o
corpo de Cristo? "Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e
todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também" (1
Coríntios 12.12). O termo "Cristo", conforme é usado aqui, inclui o
próprio Cristo e todos os membros do corpo, vistos como um todo. Portanto o
corpo de Cristo inclui a Ele próprio, como a Cabeça, e a todos os crentes sobre
a face da Terra, nos quais o Espírito Santo veio habitar. Como consequência,
cada filho de Deus que pode clamar "Aba, Pai" é um membro do corpo de
Cristo e, por esta razão, o apóstolo diz que "somos membros do Seu corpo"
(Efésios 5.30).
Este é um ponto para o qual desejo chamar sua atenção, pois
um grande número dos amados filhos de Deus ignoram que ocupam esta maravilhosa
e privilegiada posição. Por ocasião de uma visita que fiz há algum tempo a um
crente prestes a morrer, perguntei-lhe: "Sabe que você é um membro do
corpo de Cristo?". Sua resposta foi: "Não, jamais ouvi coisa
semelhante". Tão cedo não vou me esquecer do gozo que expressavam as
feições daquele moribundo à medida que eu ia expondo as Escrituras que falam
deste assunto. Permita-me, então, pedir-lhe que considere o que significa ser
um membro do corpo de Cristo. Primeiro, e o mais importante, nos ensina que
estamos unidos a Cristo - a Cristo como Homem glorificado à direita de Deus. E
uma vez que Ele é a cabeça do corpo, cada membro está de uma forma vital, e
podemos até mesmo dizer organicamente, ligado a Ele. "O que se ajunta com
o Senhor é um mesmo espírito" (1 Coríntios 6.17).
Veja, portanto, até onde vai a graça de nosso Deus! Se não
bastasse o fato de nossos pecados terem sido perdoados; de estarmos
justificados pela fé; de termos sido introduzidos no claro e perfeito favor de
Deus; de estarmos ressuscitados com Cristo; de estarmos assentados nEle nos
lugares celestiais; mesmo possuindo tanto, a despeito de estarmos cercados de
fraqueza e enfermidade neste mundo, nos é dado saber que estamos unidos a
Cristo na glória! Podemos elevar nossos olhos a Ele na glória, onde Ele está, e
dizer com toda a segurança: "Somos membros do Seu corpo, da Sua carne, e
dos Seus ossos!" (Efésios 5:3 - Versão Almeida Corrigida Fiel).
Se os crentes conhecessem esta verdade em poder, como
poderia haver discussões quanto à certeza da nossa salvação aqui e agora? E,
quando tivéssemos que enfrentar novas provas ou perigos, cada vez maiores, que
força nos daria se tivéssemos sempre em mente esta verdade: Estamos unidos a
Cristo! E, oh! que revelação isto nos dá da proximidade e intimidade que
possuímos com Ele! Pois nos foi dado conhecer que somos um com Ele próprio; que
tudo o que nos atinge, atinge a Ele também (leia Atos 9.4). Estamos, portanto,
inseparavelmente, indissoluvelmente ligados a Ele para todo o sempre.
Em segundo lugar, nos é ensinado que sendo membros do corpo
de Cristo, somos também membros uns dos outros, e é essencial que aprendamos
esta verdade se quisermos entender o caráter de nosso parentesco com todos os
filhos de Deus. Assim, o mesmo vínculo que nos une a Cristo, nos une também a
todos os crentes; pois o mesmo Espírito que nos une a Cristo nos uniu também
uns aos outros. É isto que significa a "unidade do Espírito" (Efésios
4.3), ou seja, a unidade de todos os membros de Cristo, que foi formada nesta
Terra pelo Espírito de Deus.
Se agora você abrir em 1 Coríntios 12, verá o maravilhoso
caráter do nosso mútuo parentesco, decorrente do fato de sermos membros uns dos
outros. Você pode ler do versículo 12 ao 27 para sua meditação e enquanto isso
assinalarei os importantes pontos que são ali ensinados. Em primeiro lugar, é
deixado bem claro que "o corpo não é um só membro, mas muitos"; e que
cada membro tem o seu próprio lugar no corpo. Sendo assim, o apóstolo pergunta:
"Se o pé disser: porque não sou mão, não sou do corpo; não será por isso
do corpo?". E então ele toma o cuidado de mostrar que o lugar peculiar que
cada um ocupa no corpo é o resultado do ato soberano de Deus, além de nos
exortar a não nos esquecermos que, embora sendo muitos membros, há um só corpo
(1 Coríntios 12.14-20). Como seria fácil para alguém ampliar este assunto
acrescentando seus próprios pensamentos, se não tivéssemos mais nenhuma
instrução a respeito. Mas quero apenas chamar sua atenção aqui para dois
pontos: nossa obrigação ou responsabilidade em reconhecer, primeiramente, a
diversidade de membros (v. 14) e, em segundo lugar, a unidade do todo (v. 29).
E me atrevo a acrescentar que é impossível guardar uma coisa ou outra, a menos
que você esteja congregado fora do arraial, separado de todas as denominações e
sistemas humanos, para o nome de Cristo somente.
Em segundo lugar, está claro que cada membro do corpo
necessita de todos os outros membros, pois "o olho não pode dizer à mão:
não tenho necessidade de ti; nem ainda a cabeça aos pés: não tenho necessidade
de vós", e o apóstolo continua nos ensinando que "Deus assim formou o
corpo... para que não haja divisão no corpo, mas antes tenham os membros igual
cuidado uns dos outros" (1 Coríntios 12.21-25). Somos, então, lembrados de
que o parentesco entre os membros é tão íntimo que "se um membro padece,
todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros
se regozijam com ele" (1 Coríntios 12.26).
Por estas passagens das Escrituras você poderá entender que
a expressão "o corpo de Cristo" não se trata de uma mera figura de
linguagem, como muitos a consideram, mas expressa uma realidade - a pura
realidade de nossa união com Cristo, bem como de nossa união uns com os outros.
E estou certo de que você entenderá que nossa responsabilidade para com Cristo,
como a Cabeça do corpo, e nossa responsabilidade para com os outros membros não
poderá ser compreendida, e muito menos manifestada, se esta verdade for
menosprezada ou ignorada. Mas, por outro lado, quando ela é conhecida, temos
não somente o gozo de uma união consciente com Cristo, como podemos nos
regozijar em nossa união - nossa indissolúvel união - com todos os membros do
Seu corpo em todas as partes do mundo.
Isto nos leva a resultados bastante práticos. Por exemplo,
se alguém me diz que devo filiar-me a qualquer uma das denominações existentes,
imediatamente respondo que não posso fazer algo que negue - e claramente nega -
esta preciosa verdade. "Você me pede", eu diria "para me unir a
um determinado grupo de cristãos que estão em comum acordo em determinadas
coisas; mas eu já estou unido a todos os crentes, e preciso de todos; não
posso, portanto, aceitar uma base de união que exclua qualquer um deles".
Até mesmo se me convidassem para me unir a um certo número de cristãos que não
levassem em conta as barreiras denominacionais (geralmente conhecidos como
"interdenominacionais" - N. do T.), eu responderia: "Sou um
membro do corpo de Cristo e, portanto, não posso estabelecer qualquer base de
união diferente daquela que é o corpo. Ou permaneço na base que Deus
estabeleceu ou não permaneço em base nenhuma". Sendo assim, enquanto eu
não conhecer a verdade do corpo de Cristo, não poderei compreender o lugar que
Deus gostaria que eu ocupasse neste mundo.
Mas agora deixo este assunto para sua meditação, pois estou
certo de que se você buscar nas Escrituras, na dependência do Senhor, Ele irá
guiá-lo, pelo Seu Espírito, para que você conheça a Sua vontade a este
respeito. Em minha próxima carta, se Deus quiser, apresentarei a você outro
assunto que está intimamente ligado a este, ou seja, o que se refere à mesa do
Senhor.
Edward Dennett